segunda-feira, 8 de março de 2010

Hipocrisia: Dia Internacional da Mulher!

Antes que alguma leitora desmaie diante de tanta falta de sensibilidade deste Neanderthal que vos escreve, é necessário deixar claro que sou um fervoroso fã do feminino, amante à moda antiga e homenagear a mulher creio ser um propósito, não uma ação.
Não pegarei aqui o caminho simplório, bobo e superficial do “se existe um dia internacional da mulher deveria haver também o dia internacional do homem”.
Na verdade, não tenho a menor dúvida de que os idealizadores da data tiveram as melhores intenções ao adotar o dia 8 de março de 1857 como um marco, em homenagem ao símbolo feminino que foi 129 vezes incinerado debaixo do abafado caos têxtil. O que não pode deixar de ser comentado é o que aconteceu desde então com esta “boa intenção”. Durante o dia de hoje muitas rádios tocarão John Lennon, Roberto e Erasmo Carlos, blogs publicarão textos emocionados sobre a força e a beleza de toda mulher e muitos incentivarão com palavras que devemos dar os parabéns às mulheres que amamos.
Algumas mulheres encontrarão flores em suas mesas de trabalho e outras, com certeza, receberão mensagens de gosto duvidoso, daqueles serviços horríveis de telemensagem. Muitas receberão apenas um telefonema, e outras apenas um beijo gélido.
Não há nada de errado nisso, pois creio que é muito importante oferecermos homenagens e todo o nosso carinho a quem amamos, numa data tão importante, não é?
NÃO!
Pode até ser que não seja de má fé, mas se você é um gerente que parabeniza sua funcionária pelo dia dela e depois oferece aquela promoção ao funcionário menos capacitado, que acompanha com você os jogos do seu time (já vi isso acontecer!), você é um Hipócrita! Se você parabeniza sua esposa pelo dia dela, mas chega em casa e se esparrama no sofá enquanto ela cumpre sua jornada tripla de trabalho, você é um Hipócrita! Se você cumprimenta todas as suas amigas, mas passa o restante do ano tendo o mesmo comportamento machista e sexista de sempre, você é um Hipócrita! Se você chegar ao seu trabalho hoje e, antes de qualquer coisa, parabenizar sua chefe pelo seu dia, mas continuar não admitindo ser comandado por uma Mulher, você é um Hipócrita!
O homem que não se posiciona de verdade, com sinceridade e desprendimento, frente às questões importantes da feminilidade e da relação entre os sexos deveria ter ao menos a dignidade de não ficar repetindo o clichê de “Parabéns pelo seu dia!”.
É isso aí! O Dia Internacional da Mulher deve ser mesmo para refletirmos sobre as conquistas da mulher, e para reivindicar nossos direitos, não nossos direitos como homem ou como mulher, mas como pessoas lutando por maiores conquistas sociais!
Por incrível que pareça, NÃO também!
Eu sei...
Parece estranho que eu esteja negativando tal comemoração, mesmo que ela seja encarada de forma séria, e logicamente não invalidando o mérito, mas posso explicar.
Essa data comemorativa não é hipócrita só porque os homens agem assim.
Ela é hipócrita em si, assim como todas as datas do gênero, remetendo-me subjetivamente ao Dia Internacional da Consciência Negra, tal data já pisoteada em meus artigos.
Existe um mecanismo sutil e ao mesmo tempo cruel pelo qual a sociedade perpetua seu "status quo". Se não houver uma reflexão crítica a respeito do significado de cada ato, mesmo o mais bem intencionado militante torna-se engrenagem que ajuda a mover o próprio sistema que combate. As mais justas reivindicações são absorvidas pela ordem social vigente, e nada muda.
O problema?
Datas assim limitam essa reflexão, e podemos chamar isso de “vacina ideológica”.
Para compreender, vamos pensar em como uma vacina funciona: para que o corpo se mantenha saudável (ou inalterado, no nosso caso!), uma versão enfraquecida do vírus X é ministrada, mas de forma que fique sob controle dos mecanismos de defesa do corpo,
que estarão prontos para combater qualquer manifestação real do vírus.
No caso da sociedade, a data comemorativa das minorias (as mulheres são tratadas como tal) é esse vírus X enfraquecido. Salvo exceções, a reflexão que poderia levar à mudança fica restrita há um dia pré-determinado, fica encaixotada. Todas as reivindicações são feitas com maior intensidade na data estipulada. Existem os discursos e discussões, mas no dia 9 de março as mulheres continuam sujeitas a jornadas triplas de trabalho, continuam trabalhando 50% mais que homens, na mesma função, para ganhar 50% menos, continuam objeto de valores ditatoriais (da beleza, por exemplo), continuam vítimas de violência, sofrendo todo tipo de intimidação, e a pior de todas as pieguices, a total amnésia à Divindade Feminina, sua sagrada maternidade e seu sublime e divinal alimento lácteo.
Sinceramente, o dia internacional da mulher (Sim, em minúsculo!), tal qual é hoje, é irrelevante e desnecessário. As necessidades das mulheres, de igualdade e dignidade, além das econômicas, são muito maiores do que uma data pode comportar, e de nada adianta discutirmos isso hoje e ficarmos anestesiados até o próximo mês de março.
Se for para citar algum poeta ou alguma lenda como Lennon, prefiro dizer que infelizmente a mulher continua sendo “The Nigger of the World”, e que para mudar esse cenário hipócrita precisamos de menos simbolismo, menos pieguices e mais ação.
Desde ontem vem acontecendo uma imensa publicação coletiva nas mídias que atingem as grandes massas, fomentando a valorização e a importância da mulher brasileira.
Vamos acompanhá-las, sufocar nossas mulheres de muito carinho, afeto e gentilezas, vamos ceder com mais acalento o lugar no coletivo para, não só as vovós sentarem, mas para qualquer mulher que esteja de pé, e tampouco vamos nos preocupar se uma mulher furar a fila do banco, mas façamos o máximo para que as discussões não fiquem restritas ao dia 8 de Março, e sim que o tapete vermelho esteja disposto por todos os minutos, horas, dias, meses, anos, e que as trombetas acarinhem nossos sentidos ao desfilarem diante de nossos estupefatos olhares... Mulheres!
A vida é assim...
E assim se segue...
NAMASTE!

5 C O M E N T Á R I O (S)

Tamara disse...

Vejo a necessidade do dia para lembrarmos as 129 vítimas de mentes machistas que não respeitaram a vida, acima de tudo. Podíamos mudar o nome, para o dia internacional da vida, mas aí teríamos que criar vários desses dias, não é mesmo?
Hoje em dia, vidas continuam sendo sacrificadas em nome de interesse de poucos. O individual continua sobrepondo o coletivo. Mas quem sabe um dia, não precisemos realmente de nenhum dia para lembrar das minorias simplesmente por não existirem mais.

Sandro Antunes disse...

Boa tarde Cris e muito obrigado!

Não consegui dormir essa noite, pois tive uma discussão com a minha esposa,
cheguei atrasado no serviço e cheio de dúvidas na cabeça!
Cheguei no serviço e fui verificar o meu email, abri o seu casulo
e comecei a dar uma lida nas mensagens que você postou.
Vieram em ocasião muito apropriada,
pois eu precisava muito neste momento.

Parabéns e muito obrigado!
Namaste!

Neide disse...

Oi Cristiano,

Muito interessante seu raciocínio.
Criaram um dia para a mulher,
porque os outros 364 dias pertencem ao homem.

Bj.

Neide

José Raimundo/Barbinha disse...

O que seria do preto e branco se todos gostassm do verde?
Há palavras de ordem à esquerda, à direita, ao centro, mas cá para nós:
O fino da bossa é saber escolher autonomamente o seu próprio veneno, não é mesmo?
Ocorre, porém ser essa uma coisa da qual estamos distantes.
A maioria de nós sonha com uma vida simples:
Uma casinha branca no alto da serra, um carro ecológico, férias, sucesso, educação, etc..
Bem, neste momento lembro uma cena do clássico "Tempos Modernos" de Chapplin, quando o marido enche o copo de leite direto da teta da vaca num cenário que reproduzia o American Dream. Todas essas promessas modernas parecem traduzidas ao final do texto sugerido na forma da resignação do investidor com aplicações em imóveis e ações e na


"felicidade [que] é feita de coisas pequenas
e é encontrada no simples do simples do simples!"


Bem, se envergonhar porque?
Afinal de contas, o mundo é belo e reserva, para todo aquele que trabalha(?) o incontestável acesso aos bens e produto pós-modernos com mesmo padrão de consumo americano - vem aí a China com sede inigualável de carro, pc, cel phone, etc. O planeta dá conta?

Concluindo, vivemos um tempo pleno de possibilidades para o investidor, tempo generoso para os vencedores, pena que eles sejam tão poucos, não só em terras brasilis, but all around the world.
E finalizo com Bertld Bretch:


Nada É Impossível De Mudar ( BERTOLD BRECHT )
Desconfiai do mais trivial, na aparência singelo.
E examinai, sobretudo, o que parece habitual.
Suplicamos expressamente:
Não aceiteis o que é de hábito como coisa natural,
pois em tempo de desordem sangrenta,
de confusão organizada, de arbitrariedade consciente,
de humanidade desumanizada, nada deve parecer
natural nada deve parecer impossível de mudar.


NAMASTE, Quaresma!

José Raimundo/Barbinha

@_-¯Cristiano Quaresma¯-_@ disse...

Absurdamente bem colocados seus pensamentos e citações...
Mesmo com alça de mira fina, o bem viver comum cobra-nos provar de outros
venenos, da mesma forma que é bem visto tomar o "chafezinho" sonso
que aquele cliente em potencial nos apresenta.
E aproveitando sua menção à Brecht, também desconfio das facilidades
que surgem em minha passagem e, abusando ainda, cito:
"Para quem tem uma boa posição social,
falar de comida é coisa baixa.
É compreensível: eles já comeram!" [BERTOLD BRECHT]

Concluindo, novamente agradeço sua interação
e aguardo suas frequentes visitas em meus canais web.
A vida é assim...
E assim se segue...
NAMASTE!

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